Tribunal Regional
Federal da 3ª Região PROC.
: 2001.61.00.025946-3 AC 922220 APTE:
Ministerio Publico Federal PROC:
ANDRE DE CARVALHO RAMOS (Int.Pessoal) APTE:
Uniao Federal ADV:
ANTONIO LEVI MENDES APTE:
FEDERACAO NACIONAL DOS JORNALISTAS FENAJ e outro ADV:
JOAO ROBERTO EGYDIO PIZA FONTES APDO:
SINDICATO DAS EMPRESAS DE RADIO E TELEVISAO NO ESTADO DE SAO PAULO SERTESP ADV:
RUBENS AUGUSTO CAMARGO DE MORAES APDO:
OS MESMOS REMTE:
JUIZO FEDERAL DA 16 VARA SAO PAULO Sec Jud SP RELATOR:
JUIZ CONV. MANOEL ALVARES / QUARTA TURMA R E L A T Ó R
I O O
Exmo. Sr. Juiz Federal Convocado Manoel Álvares (Relator) O
Ministério Público Federal propôs Ação Civil Pública com pedido de tutela
antecipada, de abrangência nacional, em face da UNIÃO, sustentando,
em apertada síntese, a não recepção do artigo 4º e seu inciso V do Decreto-Lei
n. 972/69, que exige a formação em curso superior de jornalismo para
o exercício profissional de jornalista e registro perante o Ministério
do Trabalho, pela Constituição Federal de 1988, em face do disposto
nos artigos 5º, IX, XIII e 220, §1º. Sustenta ainda que o dispositivo
causa lesão à liberdade do exercício de profissão e à liberdade de expressão
de pensamentos e ofende a Convenção Americana dos Direitos Humanos,
impedindo o livre acesso à informação; aduz que a profissão de jornalista
prescinde de qualificação técnica a dar ensejo à regra de exceção prevista
no artigo 5º, XIII, da Constituição Federal (fls. 02/52). Com
esses fundamentos postulou, em tutela antecipada: 1.
Seja a União obrigada a não mais registrar ou fornecer qualquer número
de inscrição no Ministério do Trabalho para os diplomados em jornalismo,
informando aos interessados a desnecessidade do registro e inscrição
para o exercício da profissão de jornalista. 2.
Seja a União obrigada a não mais executar fiscalização sobre o exercício
da profissão de jornalista por profissionais desprovidos de grau de
curso universitário de jornalismo, bem como não mais lavrar os autos
de infração correspondentes. 3.
Sejam declarados nulos todos os autos de infração lavrados contra indivíduos
por auditores-fiscais do trabalho, em fase de execução ou não, em razão
da prática do jornalismo sem o correspondente diploma. 4.
Sejam remetidos ofícios aos Tribunais de Justiça de todos os Estados
da Federação, dando ciência de antecipação de tutela, de forma a que
se aprecie a pertinência de trancamento de eventuais inquéritos policiais
ou ações penais, que por lá tramitem, tendo por objeto a apuração de
prática de delito de exercício ilegal da profissão de jornalista. Ao
final, postulou a procedência do pedido para, em caráter definitivo: 1)
Ser confirmada a tutela antecipada pleiteada. 2)
Ser fixada multa de R$10.000,00, a ser revertida em favor do Fundo Federal
de Direitos Difusos (art. 13 da Lei n. 7347/85), para cada auto de infração
lavrado em descumprimento das obrigações impostas através da concessão
do pedido. 3)
Ser a ré condenada a reparar os danos morais coletivos causados pela
conduta impugnada. A
tutela antecipada foi parcialmente deferida para determinar que a ré,
em todo o país, não mais exija o diploma de curso superior em jornalismo
para o registro no Ministério do Trabalho, informando aos interessados
a desnecessidade de apresentação de diploma para tanto, bem assim que
não execute mais fiscalização sobre o exercício da profissão de jornalista
por profissionais desprovidos de grau de nível universitário de jornalismo,
assim como deixe de exarar os autos de infração correspondentes, até
decisão final, sob pena de cominação de multa diária, nos termos do
art. 11 da Lei nº 7.347/85 (fls.317/326). A
FENAJ - Federação Nacional dos Jornalistas e o Sindicato dos Jornalistas
Profissionais no Estado de São Paulo ingressaram nos autos, na qualidade
de terceiros interessados, postulando pela devolução de prazo para interposição
de recurso de agravo de instrumento. Pedido deferido mediante a comprovação
da representação processual, interesse jurídico e legitimidade (fls.
332/333). Às
folhas 340/348, a FENAJ e o Sindicato dos Jornalistas apresentam suas
razões de interesse jurídico e legitimidade, postulando pelo ingresso
nos autos na qualidade de assistentes simples da União. Intimadas as
partes para manifestação acerca do pedido de ingresso na lide, o Ministério
Público Federal, às folhas 385/391, apresentou impugnação, postulando
pelo desentranhamento das peças constantes de folhas 332/334, 340/348
e 385/391, para autuação em apenso, bem como pelo indeferimento do ingresso
na lide da FENAJ e do Sindicato dos Jornalistas. A União apresentou
concordância com o ingresso dos assistentes (fls. 501/502). Por sua
vez, o Sindicato das Empresas de Rádio e Televisão no Estado de São
Paulo - SERTESP ingressou nos autos requerendo sua admissão como assistente
do Ministério Público Federal, na qualidade de terceiro interessado
(fls. 710). Pedidos deferidos, conforme decisão de fls. 747. A
União, às fls. 336/337, postulou pela reconsideração da decisão que
antecipou a tutela, para o fim de que as obrigações impostas fossem
dirigidas diretamente ao Ministério do Trabalho, haja vista a falta
de poderes de ingerência da AGU no Ministério do Trabalho e suas Delegacias,
detendo tão somente a representação jurídico-processual. Pedido deferido. A
FENAJ e o Sindicato dos Jornalistas interpuseram recurso de agravo de
instrumento contra a antecipação de tutela parcialmente deferida, pleiteando
o efeito suspensivo ao recurso (fls. 398/476). Da mesma forma, insurgiu-se
a União, postulando pelo efeito suspensivo ao recurso de agravo e pela
reforma da decisão monocrática que deferiu parcialmente a antecipação
da tutela (fls. 478/493). Mencionados
agravos foram recebidos neste E. Tribunal, tramitando com os números
2001.03.00.034677-0 e 2001.03.00.035349-0 (apensados). Determinado o
processamento dos agravos sem feito suspensivo, até o pronunciamento
definitivo da Turma. Esses dois recursos foram tidos por prejudicados,
em face da prolação da sentença, ora recorrida. Constam
dos autos petições de terceiros interessados (Pedro Paulo Notaro - fls.
495, Antonio Carlos Arnone - fls. 498, Adriana Carvalho - fls. 504 e
José Goulart Quirino - fls. 515) requerendo o ingresso nos autos. Pedidos
indeferidos, ante a ausência de interesse processual e legitimidade
(fls. 747). A União apresentou contestação às fls. 567, aduzindo preliminarmente:
vedação legal de antecipação da tutela em face da Fazenda Pública; ilegitimidade
ativa do Ministério Público; inadequação da via eleita; e restrição
de jurisdição a esta Região. No mérito, pugnou pela improcedência da
ação, defendendo a legislação vigente sob o fundamento de que a exigência
de formação de nível superior é indispensável para o exercício da profissão
de jornalista diante da necessária qualificação técnica e moral do profissional
em face da relevância da profissão e dos riscos que seu exercício, sem
a devida qualificação, oferecem à coletividade; sustenta que a exigência
não afeta a liberdade de expressão, nem tão pouco limita o acesso à
informação, não restando qualquer agressão à ordem constitucional vigente. Às
fls. 621 e segs., contestaram a ação a FENAJ - Federação Nacional dos
Jornalistas e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo
argüindo, preliminarmente: ilegitimidade ativa do Ministério Público
Federal; inadequação da via eleita, por sucedâneo da ação direta de
inconstitucionalidade; e configuração de litisconsórcio necessário não
observado. No mérito, sustentaram a constitucionalidade do Decreto-Lei
n. 972/69 e sua recepção pela Constituição Federal de 1988, sob o fundamento
de que a regulamentação por lei, do exercício da profissão, além de
encontrar respaldo no artigo 5º, XIII da CF de 1988, em hipótese alguma
afeta a liberdade de expressão ditada pelo artigo 220 da mesma. Ao contrário,
o § 1º do artigo invocado traz expressa a necessidade de observância
à ressalva constante do artigo 5º, XIII. Defenderam, outrossim, a necessidade
de qualificação técnica para o exercício da profissão, sob pena de colocar
em risco toda a coletividade. Refutam a tese de impedimento de acesso
à informação, invocando dispositivos que tratam da matéria. Houve
réplica do Ministério Público Federal, apresentada às fls. 756/774,
reiterando os fundamentos e pedidos da exordial. Manifestou-se
o Sindicato de Rádio e Televisão do Estado de São Paulo reiterando a
não recepção do Decreto-Lei n. 972/69 (fls. 785/796). Proferida
sentença (fls. 883/930), afastando as preliminares argüidas, com parcial
procedência do pedido para: a)
Determinar que a ré União, em todo o país, não mais exija o diploma
de curso superior em jornalismo para o registro no Ministério do Trabalho
para o exercício da profissão de jornalista, informando aos interessados
a desnecessidade de apresentação de tal diploma para tanto, bem assim
que não mais execute fiscalização sobre o exercício da profissão de
jornalista por profissionais desprovidos de grau universitário de jornalismo,
assim como deixe de exarar os autos de infração correspondentes. b)
Declarar a nulidade de todos os autos de infração pendentes de execução
lavrados por Auditores-Fiscais do Trabalho contra indivíduos, em razão
da prática do jornalismo sem o correspondente diploma. c)
Que sejam remetidos ofícios aos Tribunais de Justiça dos Estados da
Federação, de forma a que se aprecie a pertinência de trancamento de
eventuais inquéritos policiais ou ações penais em trâmite, tendo por
objeto a apuração de prática de delito de exercício ilegal da profissão
de jornalista. d)
Fixar multa de R$10.000,00 (dez mil reais), a ser revertida em favor
do Fundo Federal de Direitos Difusos, para cada auto de infração lavrado
em descumprimento das obrigações impostas no decisum. Os
fundamentos invocados na r. sentença como razão de decidir foram, em
síntese, os seguintes: a)
A exigência de regulamentação por lei ao direito do livre exercício
de profissão, a teor do artigo 5º, XIII da Constituição Federal, só
é permitida em estrita observância ao interesse público, em defesa da
coletividade, exemplificando com as profissões de engenharia e da área
de saúde, profissões que colocam em risco a vida das pessoas, caso desempenhadas
por profissionais sem capacitação técnica. Não se identificando esses
requisitos, prevalece a regra geral do livre exercício da profissão. b)
Do exercício da profissão de jornalista, não se vislumbram riscos à
coletividade e ao interesse público que justifiquem a restrição imposta
pelo Decreto-Lei n. 972/69, quanto à exigência do diploma em curso superior
de jornalista, bem como não exigem uma capacitação técnica, mas tão
somente uma formação cultural sólida e diversificada, o que não se adquire
apenas com a freqüência a uma faculdade, mas sim pelo hábito da leitura
e pelo próprio exercício da prática profissional. c)
O exercício da profissão por profissional inepto não prejudica diretamente
direito de terceiro, pelo que restaria afastado o interesse público
que consiste na garantia do direito à informação, a ser exercido sem
qualquer restrição, através da livre manifestação do pensamento, da
criação, da expressão e da informação, invocando o inciso IX do artigo
5º e caput do artigo 220, ambos da Constituição Federal. d)
Os requisitos da ética ou da moral não se adquirem em bancos de faculdade,
mas com a formação do indivíduo. e)
O leitor, o ouvinte ou o telespectador tem direito de ser informado
de maneira plena, sem qualquer censura de natureza política, ideológica
ou artística, pelos melhores profissionais, quer tenham cursado a Faculdade
de Jornalismo, quer não, mas observadas as qualificações profissionais
dos informantes. f)
Existe incompatibilidade material da norma atacada em face do novo ordenamento
que veio a consagrar as liberdades públicas, de manifestação do pensamento,
de expressão intelectual, artística e científica, independentemente
de censura prévia. g)
Não houve recepção da norma por incompatibilidade formal, haja vista
ter sido outorgado por Junta de Militares em desrespeito ao processo
legislativo vigente à época. h)
A exigência de formação superior para o exercício da profissão de jornalismo
não é compatível com a atual ordem social, diante da realidade social
do País e da necessidade de atendimento aos fins sociais e do bem comum,
na busca da eliminação das desigualdades sociais e do pleno emprego,
consagradas como princípios da ordem econômica (art. 170, VII e VIII,
da CF). i)
Há incompatibilidade dessa exigência com a Convenção Americana de Direitos
Humanos, em face do caráter vinculante desta, haja vista a ratificação
pelo Brasil. j)
Há coerência na exigência de registro no Ministério do Trabalho, vez
que em todas as profissões é salutar que exista uma entidade de controle
e fiscalização daquelas pessoas que as exercem de modo profissional. k)
É descabida a reparação por danos morais coletivos, pois eventuais sofrimentos
verificados no âmbito individual por parte das pessoas que foram impedidas
de exercer a profissão não caracteriza um dano moral coletivo indenizável,
bem como não é possível a imputação de responsabilidade da União por
todos os equívocos passados, mormente diante da natural evolução histórica
das instituições democráticas. Decisão
sujeita ao reexame necessário. Subiram os autos por força deste e de
recursos voluntários da União, da FENAJ – Federação Nacional dos Jornalistas
e Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo e do
Ministério Público Federal. Os
recursos de apelação foram recebidos somente com efeito devolutivo (fls.
1.301); esta decisão foi objeto de agravo de instrumento interposto
por FENAJ e Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São Paulo, a
fim de conferir efeito suspensivo à apelação (proc. nº 2003.03.00.042570-8).
Inicialmente foi deferido efeito suspensivo ao mencionado agravo de
instrumento, por decisão da Em. Desembargadora Federal Alda Basto (em
Turma de Férias), da qual o Ministério Público Federal tirou Agravo
Regimental. Este relator houve por bem em reconsiderar essa decisão,
processando-se o agravo sem o efeito suspensivo. A
FENAJ e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo,
ás fls. 939/995, bem como a UNIÃO, às fls.1184/1197, apresentam, em
síntese, como razões de recurso o seguinte: a)
Nulidade da sentença por cerceamento de defesa em ofensa ao princípio
do devido processo legal e da ampla defesa, sob o fundamento de que
o julgamento antecipado da lide, como verificado, não é compatível com
a presente demanda que dava azo à matéria probatória. Necessária, pois,
a produção de provas conforme requerido. b)
Ilegitimidade do Ministério Público Federal, sob o fundamento de que
não tem legitimidade para ser substituto processual do titular de interesses
individuais disponíveis. c)
O não cabimento da ação civil pública como sucedâneo da ação direta
de inconstitucionalidade, vez que a pretensão deduzida na presente representa
pedido de declaração de inconstitucionalidade em abstrato, vedado pela
via de ação civil pública, sob pena de usurpação da competência do Supremo
Tribunal Federal. d)
Nulidade da sentença pela ausência de citação de litisconsortes necessários,
sustentando que todos os entes Sindicais da Categoria e todas as Escolas
Particulares de Jornalismo são diretamente e concretamente afetados
pela tutela antecipada e final decisão. e)
No mérito, pugnam pela recepção do Decreto-Lei n. 972/69 em face da
Constituição Federal considerando a exigência fixada no § 1º do artigo
220 da CF (inciso XIII do art. 5º), colocando a profissão dentre as
quais se exige uma qualificação técnica profissional. Defendem
que o exercício da profissão, sem a devida qualificação, é prejudicial
não só a terceiros, mas a toda coletividade e à ordem pública. Apresentam
parecer da lavra da Procuradora Regional do Trabalho, Dr.ª Lucinea Alves
Campus, opinando pela constitucionalidade do Decreto-Lei n. 972/69 e
seu regulamento, destacando que o mesmo foi aprovado, em seção colegiada,
pela Coordenadoria da Defesa dos Interesses Difusos e Coletivos da Procuradoria
Geral do Trabalho e colacionando acórdão do E. Tribunal Regional do
Trabalho da 13ª Região e do Superior Tribunal de Justiça, no mesmo sentido.
Aduzem que a exigência de formação em curso superior confere maior controle
de qualidade na divulgação das notícias e das opiniões públicas não
ferindo direito de liberdade de expressão e de profissão. Destacam
que a norma atacada libera da exigência de formação superior em jornalismo
para a função de colaboradores e provisionados, afastando-se, assim,
as teses de que a exigência de diploma prejudica àqueles que desejem
se expressar ou atuar na área de jornalismo com especialização em áreas
diversas, que há impedimento do acesso às informações em regiões desprovidas
de profissionais formados ou ainda que há prejuízo aos profissionais
que já exerciam a profissão anteriormente ao Decreto-Lei e seu Regulamento.
Salientam que a norma atacada não fere o princípio do direito à informação,
pelo que não conflita com a Convenção Americana de Direitos Humanos.
Sustentam ainda que a retirada do ordenamento da exigência de formação
superior em jornalismo para o exercício da profissão viola o art. 5º
da Constituição Federal, conferindo tratamento desigual para situações
não desiguais, na medida em que não sujeita os não diplomados ao mesmo
regime a que se sujeitam os diplomados. Colacionam várias Moções de
Apoio e Solidariedade de diversas Câmaras Municipais (fls. 1099/1156).
Por fim, pedem o provimento do recurso para anulação da sentença ou
sua reforma, dando-se pela improcedência da ação. Foram
apresentadas contra-razões pelo Ministério Público Federal, às fls.
1430/1477, postulando pelo afastamento das preliminares argüidas e,
no mérito, reiterando os fundamentos constantes da exordial. Às
folhas 1367/1328, também foram ofertadas contra-razões pelo Sindicato
das Empresas de Rádio e Televisão no Estado de São Paulo - SERTESP,
que se bate pela rejeição das preliminares argüidas e, no mérito, sustenta
a existência de vício de incompetência dos Ministros para a edição do
Decreto-Lei n. 972/69; assevera que o requisito do diploma do curso
superior para o exercício da profissão previsto no art. 4º, III, do
Decreto 83.284/79, não está previsto no Decreto-Lei 972/69, pelo que
o texto regulamentador extravasou o seu limite, subvertendo a hierarquia
das normas. Sustenta, ainda, a incompatibilidade material da norma veiculada
pelo Decreto-Lei n. 972/69 em face da nova ordem social. Pede pela manutenção
da sentença. Por
sua vez, o Ministério Público Federal, em seu recurso, postula a reforma
da r. sentença na parte em que manteve a exigência de Registro do Profissional
no Ministério do Trabalho, sustentando que também se trata de barreira
ao acesso à profissão de jornalista e obstáculo à liberdade de expressão.
Invoca entendimento da Corte Interamericana de Direitos Humanos. Pugna
ainda pelo reconhecimento do dano moral coletivo a ser fixado por arbitramento. Foram
ofertadas contra-razões, às fls. 1389/1406, por FENAJ e Sindicato, e,
às fls.1413/1429, pela UNIÃO, repisando os fundamentos da improcedência
da ação. A Douta Procuradora Regional da República, Dra. Luiza Cristina
Fonseca Frischeisen, apresentou parecer às fls. 1514/1548, manifestando-se
no sentido de ser negado provimento às apelações da União, da FENAJ
e do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado de São Paulo,
bem como seja dado parcial provimento à apelação do Parquet Federal
para determinar que a União se abstenha também de exigir o registro
dos não diplomados em jornalismo. É
o relatório, dispensada revisão nos termos regimentais. MANOEL
ÁLVARES Juiz
Federal Convocado Relator V O T O O
Exmo. Senhor Juiz Federal Convocado Manoel Álvares (Relator). De
início, passo à análise das questões preliminares suscitadas nos recursos
voluntários. 1. Da legitimidade
ativa do Ministério Público. Como
é cediço, a Constituição Federal, no art. 127, caput, confere legitimidade
ao Ministério Público para sair em defesa da ordem jurídica, do regime
democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis. De
outra parte, a Lei Orgânica do Ministério Público da União (LC nº 75/93),
em seu artigo 25, estatui: "Além das funções previstas nas Constituições
Federal e Estaduais, na Lei Orgânica e em outras leis, incumbe, ainda,
ao Ministério Público: ... IV - promover o inquérito civil e a ação
civil pública, na forma da lei: a) para a proteção, prevenção e reparação
dos danos causados ao meio ambiente, ao consumidor, aos bens e direitos
de valor artístico, estético, histórico, turístico e paisagístico, e
a outros interesses difusos, coletivos e individuais indisponíveis e
homogêneos". O
interesse que se busca tutelar na presente demanda é, eminentemente,
de ordem social e pública, indo além dos interesses individuais homogêneos
do exercício da profissão de jornalista, alcançando direitos outros
protegidos constitucionalmente, como a liberdade de expressão e acesso
à informação, estes tidos como interesses ou direitos difusos, vez que
são transindividuais, de natureza indivisível, e titularizados por pessoas
indeterminadas. Assim,
ainda que a questão estivesse afeta apenas à proteção de direitos individuais
homogêneos, mas em face da presença inquestionável do interesse social
relevante nessa proteção, legitimado está o Ministério Público Federal
para a propositura da presente ação civil pública. Por
tais fundamentos, rejeito a argüição preliminar de ilegitimidade ativa. 2. Da inadequação
da via eleita. Sobre
a questão, reporto-me à decisão, reproduzida a fls. 697,que proferi
quando apreciei pedido de efeito suspensivo ao agravo de instrumento
tirado contra o deferimento de antecipação dos efeitos da tutela, nos
seguintes termos: "De
outra parte, não há que se confundir ação direta de inconstitucionalidade,
por meio da qual se faz o controle concentrado, com a ação civil pública,
onde o controle de inconstitucionalidade é apenas incidental e difuso,
vale dizer, a competência privativa do C. Supremo Tribunal Federal diz
respeito à declaração de inconstitucionalidade de lei, ao passo que
nas ações individuais ou coletivas pode-se pretender o reconhecimento
de eventual inconstitucionalidade na aplicação da lei". Esse
entendimento vem sendo reiteradamente acolhido pela Suprema Corte, consoante
julgados citados a fls. 1447/1449. Deve
ser ressaltado, ainda, o fato de que a questão deve ser resolvida pelo
fenômeno da recepção, vez que a norma impugnada é anterior à Constituição
Federal vigente, não se podendo falar em controle de inconstitucionalidade. Revela-se,
pois, legítima e adequada a via da ação civil pública eleita pelo autor,
pelo que rejeito a preliminar argüida. 3. Nulidade da
sentença por cerceamento de defesa em ofensa ao princípio do devido
processo legal e da ampla defesa. Dispõe
o artigo 330 do Código de Processo Civil: "O juiz conhecerá diretamente
do pedido, proferindo sentença: I - quando a questão de mérito for unicamente
de direito, ou, sendo de direito e de fato, não houver necessidade de
produzir prova em audiência; II
- quando ocorrer a revelia (art. 319)". Cumpre
ao julgador avaliar a questão posta em juízo, verificando se versa matéria
eminentemente de direito, caso em que, mesmo havendo pedido expresso
de produção de provas, entendendo pela sua desnecessidade e, encontrando-se
nos autos elementos suficientes para a formação de sua convicção, proferirá
sentença. No
caso, embora manifestada a pretensão por produção de prova em audiência,
forçoso reconhecer que a matéria dos autos é eminentemente de direito,
constando dos autos documentação e fundamentação de todas as partes
litigantes, não se vislumbrando qualquer questão de fato que justificasse
a obrigatoriedade de dilação probatória, máxime para a colheita de depoimentos
de profissionais da área de jornalismo. A
questão não encontra discrepância na jurisprudência dos Tribunais: "Em
matéria de julgamento antecipado da lide, predomina a prudente discrição
do magistrado, no exame da necessidade ou não da realização de prova
em audiência, ante as circunstâncias de cada caso concreto e a necessidade
de não ofender o princípio basilar do pleno contraditório" (STJ-4ª
Turma, REsp 3.047-ES, Rel. Min. Athos Carneiro, j. 21.8.90, não conheceram,
v.u., DJU 17.9.90, p. 9.514). E
ainda: "Constantes
dos autos elementos de prova documental suficientes para formar o convencimento
do julgador, inocorre cerceamento de defesa se julgada antecipadamente
a controvérsia" (STJ-4ª Turma, Ag 14.952-DF-AgRg, Rel. Min. Sálvio
de Figueiredo, j. 4.12.91, negaram provimento, v.u., DJU 3.2.92, p.
472). Por esses fundamentos, rejeito a argüição de nulidade suscitada. 4. Nulidade da
sentença pela ausência de citação de litisconsortes necessários. Há
dois critérios para a configuração de litisconsórcio necessário: quanto
à obrigatoriedade expressa de sua formação e quanto ao direito material.
O litisconsórcio necessário pode se dar por lei ou pela natureza da
relação jurídica. No caso, não se vislumbra a obrigatoriedade legal. A
questão deve ser analisada e resolvida, pois, em razão da natureza da
relação jurídica. Nesse caso, haverá litisconsórcio necessário se verificada
a possibilidade de a sentença atingir diretamente a esfera jurídica
de outrem. De outra forma, se a sentença tiver potencialidade para atingir
reflexamente direito de outrem, este poderá ingressar no processo como
assistente simples, a teor do artigo 50 do CPC, mas não como litisconsorte
necessário. Sustentam
a União, a FENAJ e o Sindicato dos Jornalistas Profissionais de São
Paulo tratar-se de litisconsórcio necessário em relação a todas as Faculdades
e Cursos Superiores de Jornalismo e todos os Sindicatos representativos
da categoria dentro de suas respectivas bases territoriais. De
plano, verifica-se que, quanto às Faculdades e Cursos Superiores de
Jornalismo, a sentença poderá atingi-los de forma reflexa e não diretamente,
afastando-se a condição de litisconsortes necessários, remanescendo
a possibilidade de intervenção como assistentes. Já
quanto aos Sindicatos representativos da categoria, considerando que
a presente ação é de eficácia nacional e não está adstrita à base territorial
desta Seção Judiciária, a questão merece maior atenção. A FENAJ, na
qualidade de Federação Nacional, consoante seu Estatuto Social e sua
própria fundamentação constante de fls. 341: "(...) é entidade
sindical, que congrega Sindicatos de Jornalistas do Brasil e representa
os jornalistas, em nível nacional, para defesa de seus interesses profissionais,
lutas e reivindicações, nos termos do art. 1º de seu Estatuto Social".
Assim, sua legitimação é notória, tanto assim que seu ingresso nos autos
foi deferido pelo juízo monocrático. De
igual forma, cada Sindicato, em suas respectivas bases territoriais,
cabendo-lhes as mesmas funções, a defesa dos direitos e interesses coletivos
ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas
(inciso III do art. 8º, CF), caberia a postulação de ingresso no feito,
como se verificou por parte de dois Sindicatos. Assim,
certo é que todos os Sindicatos da categoria têm legitimidade para integrar
a lide, restando saber se na qualidade de litisconsortes facultativos
ou necessários ou ainda como assistentes simples. A
própria lei da ação civil pública resolve a questão. Com efeito, está
expresso no § 2º do art. 5º da Lei nº 7.347/85: "Fica facultado
ao Poder Público e a outras associações legitimadas nos termos deste
artigo habilitar-se como litisconsortes de qualquer das partes".
A previsão é clara ao determinar a facultatividade da formação litisconsorcial
e não a sua necessariedade. Assim,
todos os Sindicatos legitimados que pretendessem atuar no processo,
poderiam tê-lo feito, assim como o fizeram a FENAJ, o Sindicato dos
Jornalistas Profissionais de São Paulo e o Sindicato das Empresas de
Rádio e Televisão no Estado de São Paulo - SERTESP. Ademais,
deve ser ressaltado que a FENAJ, efetivamente, praticou todos os atos
que poderia praticar como litisconsorte facultativa, sem qualquer prejuízo,
sendo ainda certo que é detentora de representatividade nacional, não
havendo que se falar em qualquer nulidade ou prejuízo que tivesse o
condão de macular a r. sentença. Pelo exposto, também rejeito a preliminar
de nulidade processual argüida. Ultrapassadas
as questões preliminares e rejeitadas as argüições de nulidade, passo
à análise do mérito da causa. O Ministério Público Federal insurge-se
contra as exigências traçadas no Decreto-Lei n. 972, de 17 de outubro
de 1969, para o exercício da profissão de jornalista, mormente as veiculadas
pelo artigo 4º e inciso V, dando-as por indevidas, vez que não recepcionadas
pela Carta Política de 1988, por ofensa às garantias constitucionais
de liberdade de manifestação de pensamento (art. 5º, IV), liberdade
de expressão de comunicação independentemente de censura ou licença
(art. 5º, IX), da liberdade de profissão (art. 5º, XIII) e liberdade
de expressão e informação jornalística (art. 220 e §§), bem como inobservância
e violação da Convenção Americana de Direitos Humanos. O
dispositivo atacado tem a seguinte redação: "Art.
4º. O exercício da profissão de jornalista requer prévio registro no
órgão regional competente do Ministério do Trabalho e Previdência Social
que se fará mediante a apresentação de: (...) V
- diploma de curso superior de jornalismo, oficial ou reconhecido, registrado
no Ministério da Educação e Cultura ou em instituição por este credenciada,
para as funções relacionadas de "a" a "g" no artigo
6º". Como
se vê, a questão é eminentemente constitucional federal e requer, de
início, seja feito um retrospecto de como foi tratada em nossas Constituições. A
Constituição Federal de 1934 (art. 113, n. 13) já garantia o livre exercício
de qualquer profissão, desde que "observadas as condições de capacidade
técnica e outras que a lei estabelecer, ditadas pelo interesse público". A
Carta de 1937, apesar do cunho ditatorial e restritivo à manifestação
livre de pensamentos, inclusive restringindo a atividade de imprensa,
assegurou: "Art.
122. (...) 8.
A liberdade de escolha de profissão ou do gênero de trabalho, indústria
ou comércio, observadas as condições de capacidade e as restrições impostas
pelo bem público, nos termos da lei". A
Constituição Federal de 1946 resgatou a liberdade de manifestação de
pensamentos e do exercício profissional, mantendo, porém, a mesma ressalva: "Art.
141. (...) §
14 - É livre o exercício de qualquer profissão, observadas as condições
de capacidade que a lei estabelecer". Na
mesma linha a Constituição de 1967, mantida inclusive sua redação quando
da promulgação da Emenda Constitucional nº 1, de 17 de outubro de 1969,
ainda que sob as condições antidemocráticas verificadas à época, sob
cuja vigência foi editado o Decreto-Lei n.º 972/69, assim dispondo: "Artigo
153. (...) §
23. É livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, observadas
as condições de capacidade que a lei estabelecer". A
atual Constituição Federal, ao tratar dos Direitos e Deveres Individuais
e Coletivos, dispõe: "Art.
5º. (...) XIII
- é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas
as qualificações profissionais que a lei estabelecer;". Da
simples leitura dos textos citados, verifica-se que o legislador constituinte
manteve, sistematicamente, a possibilidade de norma infraconstitucional
regulamentar e exigir qualificações técnicas necessárias para o exercício
de determinadas profissões em atendimento aos interesses e necessidades
de ordem pública. Nenhuma
dúvida, pois, sobre a possibilidade de lei ordinária regulamentar o
exercício de determinadas profissões, seja na vigência das Constituições
precedentes, seja na atual, remanescendo, contudo, a tormentosa questão
da categoria a ser atribuída à profissão de jornalista, se entre as
de necessária regulamentação ou colocando-a no plano das que não necessitam
de qualificação ou regulamentação específica. Em
outras palavras, o Decreto-lei n. 972, de 17 de outubro de 1969, ou
mais especificamente, o seu artigo 4º e inciso V teriam sido recepcionados
pela Constituição Federal de 1988, vez que no Estado Democrático de
Direito brasileiro estão asseguradas as garantias da liberdade de manifestação
do pensamento, de comunicação independentemente de censura ou licença,
do exercício de qualquer ofício ou profissão e de informação jornalística? Nesse
passo, são necessários breves comentários acerca do fenômeno da recepção
de leis em face de um novo ordenamento jurídico, invocando, para tanto,
os ensinamentos de Celso Ribeiro Bastos e Ives Gandra Martins, in "Comentários
à Constituição do Brasil" (Saraiva, 1988, 1º V. p. 367/368): "...
De fato, elas perdem o suporte de validade que lhes dava a Constituição
anterior. Entretanto, ao mesmo tempo, elas recebem novo suporte, novo
apoio, expresso ou tácito, da Constituição nova. Este é o fenômeno da
recepção, similar à recepção do direito romano na Europa. Trata-se de
um processo abreviado de criação de normas jurídicas, pelo qual a nova
Constituição adota as leis já existentes, com ela compatíveis, dando-lhes
validade, e assim evita o trabalho quase impossível de elaborar uma
nova legislação de um dia para o outro. Portanto, a nova lei não é idêntica
à lei anterior; ambas, têm o mesmo conteúdo, mas a nova lei tem seu
fundamento na nova Constituição, a razão de sua validade é, então, diferente.
Do exposto se constata que há uma grande diferença entre a lei constitucional
anterior e a lei ordinária também anterior. Com a entrada em vigor da
Constituição, cessa a eficácia da norma constitucional, o mesmo não
se dando com a legislação ordinária anterior, a qual não cessa de viger,
embora o novo fundamento de validade venha informado pelos princípios
materiais da nova Constituição. O único obstáculo a transpor é não ser
contrária à nova Constituição. Dá-se portanto uma novação, o que significa
que as normas ordinárias são recepcionadas pela nova ordem constitucional
e submetidas a um novo fundamento de validade". E
prosseguem os mestres: "A
única exigência para que o direito ordinário anterior sobreviva debaixo
da nova Constituição é que não mantenha com ela nenhuma contrariedade,
não importando que a mantivesse com a anterior, quer do ponto de vista
material, quer formal. Não que a nova Constituição esteja a convalidar
vícios anteriores. Ela simplesmente dispõe ex novo. O que se quer dizer
é que o fato de uma norma ter sido aprovada por um ato inferior à lei,
mas que sob o regime antigo tinha força de lei, não é óbice para que
continue em vigor debaixo da Constituição nova que exige lei formal
para tanto. No nosso direito até hoje temos em vigor atos normativos
com força de lei, embora tivessem sido aprovados à época (período imediatamente
anterior à constitucionalização de 1934) por meros decretos". Pois
bem. O Decreto-Lei n.º 972, de 17 de outubro de 1969, veio regulamentar
o exercício da profissão de jornalista, contendo norma de cunho conceitual
e restritivo somente quanto ao aspecto de exigência de qualificação
para o exercício da profissão e registro perante o órgão competente,
assim dispondo: "Art.
1º. O exercício da profissão de jornalista é livre, em todo o território
nacional, aos que satisfizerem as condições estabelecidas neste Decreto-Lei". Os
artigos 2º e 3º trazem os conceitos de profissão de jornalista e de
empresa jornalística, enumerando as atividades da profissão e das empresas,
respectivamente: "Art.
2º. A profissão de jornalista compreende, privativamente, o exercício
habitual e remunerado de qualquer das seguintes atividades: a)
redação, condensação, titulação, interpretação, correção ou coordenação
de matéria a ser divulgada, contenha ou não comentário; b)
comentário ou crônica, pelo rádio ou pela televisão; c)
entrevista, inquérito ou reportagem, escrita ou falda; d)
planejamento, organização, direção e eventual execução de serviços técnicos
de jornalismo, como os de arquivo, ilustração ou distribuição gráfica
de matéria a ser divulgada; e)
planejamento, organização de administração técnica dos serviços de que
trata a alínea "a"; f)
ensino de técnicas de jornalismo; g)
coleta de notícias ou informações e seu preparo para divulgação; h)
revisão de originais de matéria jornalística, com vistas à correção
redacional e a adequação da linguagem; i)
organização e conservação de arquivo jornalístico, e pesquisa dos respectivos
dados para a elaboração de notícias; j)
execução da distribuição gráfica de texto, fotografia ou ilustração
de caráter jornalístico, para fins de divulgação; l)
execução de desenhos artísticos ou técnicos de caráter jornalístico. "Art.
3º Considera-se empresa jornalística, para os efeitos deste Decreto-Lei,
aquela que tenha como atividade a edição de jornal ou revista, ou a
distribuição de noticiário, com funcionamento efetivo idoneidade financeira
e registro legal. §
1º Equipara-se a empresa jornalística a seção ou serviço de empresa
de radiodifusão, televisão ou divulgação cinematográfica, ou de agência
de publicidade, onde sejam exercidas as atividades prevista no artigo
2º. §
2º O órgão da administração pública direta ou autárquica que mantiver
jornalista sob vínculo de direito público prestará, para fins de
registro, a declaração de exercício profissional ou de cumprimento de
estágio. (Revogado pela Lei nº 6612/78) §
3º A empresa não jornalística sob cuja responsabilidade se editar publicação
destinada a circulação externa, promoverá o cumprimento
desta lei relativamente aos jornalistas que contratar, observado, porém,
o que determina o artigo 8º, § 4º". Esses
dispositivos iniciais não sofreram restrição por parte do autor, até
porque claramente não apresentam qualquer incompatibilidade com a Constituição
de 1988. Opunctum saliens da questão em debate é
o comando emanado do artigo 4º do Decreto-Lei n.º 972/69, assim expresso: "Art.
4º. O exercício da profissão de jornalista requer prévio registro no
órgão regional competente do Ministério do Trabalho e Previdência Social
que se fará mediante a apresentação de: I
- prova de nacionalidade brasileira; II
- folha corrida; III
- carteira profissional; IV
- declaração de cumprimento de estágio em empresa jornalística; (Revogado
pela Lei n. 6612/78) V
- diploma de curso superior de jornalismo, oficial ou reconhecido registrado
no Ministério da Educação e Cultura ou em instituição por este credenciada,
para as funções relacionadas de "a" a "g" no artigo
6º." §
1º O estágio de que trata o item IV será disciplinado em regulamento,
devendo compreender período de trabalho não inferior a um ano precedido
de registro no mesmo órgão a que se refere este artigo. (Revogado pela
Lei n. 6612/78) §
2º O aluno do último ano de curso de jornalismo poderá ser contratado
como estagiário, na forma do parágrafo anterior em qualquer das funções
enumeradas no artigo 6º. (Revogado pela Lei n. 6612/78) §
1º O regulamento disporá ainda sobre o registro especial de: (parágrafo
renumerado pela Lei n. 7360/85 - de § 3º para §1º) a)
colaborador, assim entendido aquele que mediante remuneração e sem relação
de emprego, produz trabalho de natureza técnica, científica ou cultural,
relacionado com a sua especialização, para ser divulgado com o nome
de qualificação do autor. (redação alterada pela Lei n. 6612/78); b)
funcionário público titular de cargo cujas atribuições legais coincidam
com as do artigo 2º; c)
provisionados na forma do artigo 12, aos quais será assegurado o direito
de transformar seu registro em profissional desde que comprovem o exercício
de atividade jornalística nos dois últimos anos anteriores a data do
Regulamento. (nova redação dada pela Lei n. 7.360/85) § 2º O registro
de que tratam as alíneas "a" e "b" do parágrafo
anterior não implica o reconhecimento de quaisquer direitos que decorram
da condição de empregado, nem, no caso da alínea "b", os resultantes
do exercício privado e autônomo da profissão. (parágrafo renumerado
através da Lei n. 7360/85 - de §4º para §2º) Merece
destaque, desde logo, que a norma ora atacada por que não teria sido
recepcionada pela ordem constitucional vigente, foi reiteradamente alterada
ou regulamentada: em 1978 (Lei 6.612), em 1979 (Decreto 83.284, que
deu nova regulamentação ao Decreto-Lei n. 972/69), em 1985 (Lei 7.360)
e, finalmente, em 1986 (Decreto 91.902, que regulamentou a Lei 7.360/85). Há,
ainda, os seguintes dispositivos pertinentes e complementadores ao entendimento
e solução da questão: "Art.
6º. As funções desempenhadas pelos jornalistas profissionais, como empregados,
serão assim classificadas: a)
Redator: aquele que tem o encargo de redigir matéria de caráter informativo,
desprovida de apreciação ou comentários; b)
Noticiarista: aquele que tem o encargo de redigir matéria de caráter
informático, desprovida de apreciação ou comentários; c)
Repórter: aquele que cumpre a determinação de colher notícias ou informações,
preparando-a para divulgação; d)
Repórter de Setor: aquele que tem o encargo de colher notícias ou informações
sobre assuntos pré-deteminados, preparando-as para divulgação; e)
Rádio-Repórter: aquele a quem cabe a difusão oral de acontecimento ou
entrevista pelo rádio ou pela televisão, no instante ou no local em
que ocorram, assim como o comentário ou crônica, pelos mesmos veículos; f)
Arquivista-Pesquisador: aquele que tem a incumbência de organizar e
conservar cultural e tecnicamente, o arquivo redatorial, procedendo
à pesquisa dos respectivos dados para a elaboração de notícias: g)
Revisor: aquele que tem o encargo de rever as provas tipográficas de
matéria jornalística; h)
Ilustrador: aquele que tem a seu cargo criar ou executar desenhos artísticos
ou técnicos de caráter jornalístico; i)
Repórter-Fotográfico: aquele a quem cabe registrar, fotograficamente,
quaisquer fatos ou assuntos de interesse jornalístico; j)
Repórter-Cinematográfico: aquele a quem cabe registrar cinematograficamente,
quaisquer fatos ou assuntos de interesse jornalístico; l)
Diagramador: aquele a quem compete planejar e executar a distribuição
gráfica de matérias, fotografias ou ilustrações de caráter jornalístico,
para fins de publicação. Parágrafo
único: também serão privativas de jornalista profissional as funções
de confiança pertinentes às atividades descritas no artigo 2º como editor,
secretário, subsecretário, chefe de reportagem e chefe de revisão. ......... "Art.
10. Até noventa dias após a publicação do regulamento deste Decreto-Lei,
poderá obter registro de jornalista profissional quem comprovar
o exercício atual da profissão, em qualquer das atividades descritas
no artigo 2º, desde doze meses consecutivos ou vinte e
quatro intercalados, mediante: I
- os documentos previstos nos item I, II e III do artigo 4º; II
- atestado de empresa jornalística, do qual conste a data de admissão,
a função exercida e o salário ajustado; III
- prova de contribuição para o instituto Nacional de Previdência Social,
relativa à relação de emprego com a empresa jornalística atestante. ......... "Art.
12. A admissão de jornalistas, nas funções relacionadas de "a"
a "g" no artigo 6º, e com dispensa da exigência constante
do item V do artigo 4º, será permitida enquanto o Poder Executivo não
dispuser em contrário, até o limite de um terço das novas admissões
a partir da vigência deste Decreto-Lei". O
Decreto n.º 83.284, de 13 de março de 1979, trouxe nova regulamentação
ao Decreto-Lei n. 972/69 e o fez da forma mais completa possível, pelo
que não pode deixar de ser analisado em conjunto com a norma atacada,
principalmente em face de duas alegações constantes da inicial, quais
sejam a impossibilidade do exercício da profissão sem formação específica
para áreas de conhecimentos especializados e a limitação de acesso à
informação em regiões e municípios desprovidos dos profissionais com
formação superior em jornalismo. Com
efeito, dispõe o regulamento: "Art.
4º. O exercício de profissão de jornalista requer prévio registro no
Órgão Regional do Ministério do Trabalho, que se fará mediante
a apresentação de: (...) III
- diploma de curso de nível superior de Jornalismo ou de Comunicação
Social, habilitação jornalismo, fornecido por estabelecimento de ensino
reconhecido na forma da lei, para as funções relacionadas nos itens
I a VII do artigo 11;" (...) "Art.
5º. O Ministério do Trabalho, concederá, desde que satisfeitas as exigências
constantes deste decreto, registro especial ao: I
- colaborador, assim entendido aquele que, mediante remuneração e sem
relação de emprego, produz trabalho de natureza técnica, científica
ou cultural, relacionado com a sua especialização, para ser divulgado
com o nome e qualificação do autor; II
- funcionário público titular de cargo cujas atribuições legais coincidam
com as mencionadas no artigo 2º; III
- provisionado. Parágrafo
único. O registro de que tratam os itens I e II deste artigo não implica
o reconhecimento de quaisquer direitos que decorram da condição de empregado,
nem, no caso do item II, os resultantes do exercício privado e autônomo
da profissão. "Art.
6º. Para o registro especial de colaborador é necessário a apresentação
de: I
- prova de nacionalidade brasileira; II
- prova de que não está denunciado ou condenado pela prática de ilícito
penal; III
- declaração de empresa jornalística, ou que a ela se equiparada, informando
do seu interesse pelo registro de colaborador do candidato, onde conste
a sua especialização, remuneração contratada e pseudônimo, se houver. "Art.
7º. Para o registro especial de funcionário público titular de cargo
cujas atribuições legais coincidam com as mencionadas no artigo 2º,
é necessário a apresentação de ato de nomeação ou contratação para cargo
ou emprego com aquelas atribuições, além do cumprimento do que estabelece
o artigo 4º. "Art.
8º. Para o registro especial de provisionado é necessário a apresentação
de: I
- prova de nacionalidade brasileira; II
- prova de que não está denunciado ou condenado pela prática de ilícito
penal; III
- declaração, fornecida pela empresa jornalística ou que a ela seja
equiparada, da qual conste a função a ser exercida e o salário correspondente; IV
- diploma de curso de nível superior ou certificado de ensino de 2º
grau fornecido por estabelecimento de ensino reconhecido na forma da
lei, para as funções relacionadas nos itens I a VII do artigo 11. V
- declaração, fornecida pela entidade sindical representativa da categoria
profissional, com base territorial abrangendo o município no qual o
provisionado irá desempenhar suas funções, de que não há jornalista
associado do Sindicato, domiciliado naquele município, disponível para
contratação; VI
- Carteira de Trabalho e Previdência Social." (...) "Art.
9º. Será efetuado, no Ministério do Trabalho, registro dos diretores
de empresas jornalísticas que, não sendo Jornalista, respondem pelas
respectivas publicações, para o que é necessário a apresentação de: (...) "Art.
11. As funções desempenhadas pelos jornalistas, como empregados, serão
assim classificadas: I
- Redator: aquele que, além das incumbências de redação comum, tem o
encargo de redigir editoriais, crônicas ou comentários; II
- Noticiarista: aquele que tem o encargo de redigir matérias de caráter
informativo, desprovidas de apreciações ou comentários, preparando-as
ou redigindo-as para divulgação; III
- Repórter: aquele que cumpre a determinação de colher notícias ou informações,
preparando ou redigindo matéria para divulgação; IV
- Repórter de Setor: aquele que tem o encargo de colher notícias ou
informações sobre assuntos predeteminados, preparando-as ou redigindo-as
para divulgação; V
- Rádio-Repórter: aquele a quem cabe a difusão oral de acontecimento
ou entrevista pelo rádio ou pela televisão, no instante ou no local
em que ocorram, assim como o comentário ou crônica, pelos mesmos veículos; VI
- Arquivista-Pesquisador: aquele que tem a incumbência de organizar
e conservar cultural e tecnicamente, o arquivo redatorial, procedendo
à pesquisa dos respectivos dados para a elaboração de notícias: VII
- Revisor: aquele que tem o encargo de rever as provas tipográficas
de matéria jornalística; VIII
- Ilustrador: aquele que tem a seu cargo criar ou executar desenhos
artísticos ou técnicos de caráter jornalístico; IX
- Repórter Fotográfico: aquele a quem cabe registrar fotograficamente
quaisquer fatos ou assuntos de interesse jornalístico; X
- Repórter Cinematográfico: aquele a quem cabe registrar cinematograficamente
quaisquer fatos ou assuntos de interesse jornalístico; XI
- Diagramador: aquele a quem compete planejar e executar a distribuição
gráfica de matérias, fotografias ou ilustrações de caráter jornalístico,
para fins de publicação. Parágrafo
único: Os Sindicatos serão ouvidos sobre o exato enquadramento de cada
profissional." "Art.
16. A admissão de provisionado, para exercer funções relacionadas nos
itens I a VII do artigo 11, será permitida nos municípios onde não exista
curso de jornalismo reconhecido na forma da lei e comprovadamente, não
haja jornalista domiciliado, associado do sindicato representativo da
categoria profissional, disponível para contratação. Parágrafo
único. O provisionado nos termos deste artigo poderá exercer suas atividades
somente no município para a qual foi registrado. "Art.
17. Os atuais portadores de registro especial de provisionado poderão
exercer suas atividades no Estado onde foram contratados". Finalmente,
completando o conjunto normativo sob análise, a Lei n. 7.360/85, que
alterou dispositivos do Decreto-Lei n. 972/69, foi regulamentada pelo
Decreto n. 91.002, de 11 de novembro de 1985, restando determinado: "Art.
1º. É assegurado ao jornalista provisionado na forma do artigo 12 do
Decreto-lei nº 972, de 17 de outubro de 1969, o direito de transformar
seu registro para jornalista profissional. "Art.
2º. Para que se efetive a transformação referida no artigo anterior,
o provisionado deverá comprovar: I
-o registro como provisionado na forma do artigo 12, do Decreto-lei
nº 972, de 17 de outubro de 1969, e II
- o exercício de atividade jornalística nos dois anos imediatamente
anteriores ao Decreto nº 83.284, de 13 de maio de 1979". Entendo
terem sido referidos, se não todos, ao menos os mais pertinentes e necessários
dispositivos regulamentares e legais indispensáveis ao enfrentamento
da questão relacionada com a recepção ou não do Decreto-Lei nº 972/69
pela nova ordem constitucional inaugurada com a Constituição Federal
de 1988. Com
efeito. A vigente Constituição Federal garante a todos, indistintamente
e sem quaisquer restrições, o direito à livre manifestação do pensamento
(art. 5º, IV) e à liberdade de expressão, independentemente de censura
ou licença (art. 5º, IX). São direitos difusos, assegurados a cada um
e a todos, ao mesmo tempo, sem qualquer barreira de ordem social, econômica,
religiosa, política, profissional ou cultural. Contudo,
a questão que se coloca de forma específica, nos autos, diz respeito
à liberdade do exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão,
ou, simplesmente, liberdade de profissão. Não
se pode confundir liberdade de manifestação do pensamento ou de expressão
com liberdade de profissão. Quanto a esta, a Constituição assegurou
o seu livre exercício, desde que atendidas as qualificações profissionais
estabelecidas em lei (art. 5º, XIII). O
texto constitucional não deixa dúvidas, portanto, de que a lei ordinária
pode estabelecer quais as qualificações profissionais são necessárias
para o livre exercício de determinada profissão. Resta
saber qual o critério deve orientar o legislador infra-constitucional
para o estabelecimento dessas qualificações. A MM. Juíza sentenciante
cita, às fls. 903, trecho do voto do em. Ministro Thompson Flores, proferido
em antigo julgado do C. Supremo Tribunal Federal (RE 70.563/SP - RTJ
58/279), nos seguintes termos: "A
lei, para fixar as condições de capacidade, terá de inspirar-se em critério
de defesa social e não em puro arbítrio. Nem todas as profissões exigem
condições legais de exercício. Outras, ao contrário, o exigem. A defesa
social decide". Partindo
dessa premissa, a douta julgadora de primeiro grau chega à conclusão
de que não é razoável exigir-se qualificação profissional específica
para o exercício da profissão de jornalista. Creio
que a leitura a ser feita do precedente, com a devida vênia, é bem outra.
Primeiro, porque o caso tratava da regulamentação da profissão de "corretor
de imóveis", mais especificamente sobre a constitucionalidade ou
não de um dispositivo, o art. 7º da Lei nº 4.116/62, que possibilitava
a cobrança de comissão de intermediação apenas a quem fosse inscrito
no Conselho respectivo. Segundo, porque os exemplos de profissões citados
pelo em. Ministro, sem qualquer desmerecimento às pessoas que as exercem
(lavradores, pedreiros), não podem servir de parâmetro ao exercício
profissional do jornalismo. O
em. Ministro relator adota ainda como razão de decidir, o que chama
de "jurídico e substancioso acórdão relatado pelo eminente Des.
Rodrigues Alckmin, do Tribunal de Justiça de São Paulo", do qual
transcreve os seguintes trechos: "Começa essa lei por estabelecer
o regulamento de uma 'profissão de corretor de imóveis', profissão que,
consoante o critério proposto por Sampaio Dória, não pode ser regulamentada
sob o aspecto de capacidade técnica, por dupla razão. Primeiro, porque
essa atividade, mesmo exercida por inepto, não prejudicará diretamente
a direito de terceiro (...). Em segundo lugar, porque não há requisito
de capacidade técnica algum, para exercê-la. Que diplomas, que aprendizado,
que prova de conhecimento se exigem para o exercício dessa profissão?
Nenhum é necessário (...). Note-se, no caso, que nada obsta a que até
indivíduos analfabetos possam agenciar a venda de imóveis, sem danos
a terceiros e até com êxitos". À
toda evidência, tais parâmetros não podem ser utilizados, quando a discussão
se reporta à legitimidade ou não da regulamentação da profissão de jornalista... Não
se pode ignorar a relevante função social do jornalismo, daí resultando
a grande responsabilidade do profissional e riscos que o mau exercício
da profissão oferecem à coletividade e ao País. Os
danos efetivos, de ordem individual ou coletiva, que o exercício da
profissão de jornalista por pessoa desqualificada ou de forma irresponsável
pode gerar são incalculáveis. Os bens jurídicos que podem ser afetados
são da mesma magnitude que tantos outros direitos fundamentais tutelados,
como a vida, a liberdade, a saúde e a educação. Os
riscos não se afastam nem se diferenciam do exercício irregular da advocacia,
da medicina, da veterinária, da odontologia, da engenharia, do magistério
e outras tantas profissões. Oportuna
a manifestação do Sindicato dos Jornalistas, constante a fls. 128 dos
autos: "A
atividade profissional de jornalista não pode ser exercida por pessoas
inabilitadas, ainda que cultas, experientes ou especialistas de determinados
assuntos, pois a missão de informar é tão séria que gera conseqüências
sociais, podendo afetar também o cidadão individualmente. Assim como
o advogado que estuda as técnicas jurídicas e deve ser habilitado par
exercer a sua profissão, respondendo civilmente pelos seus atos, o mesmo
do médico responsável pela boa aplicação da ciência e conhecimento técnico
para salvar vidas, o jornalista é pela correta apuração dos fatos e
melhor apresentação da informação ao público. Certamente, que os princípios
constitucionais preservam a atividade jornalística de qualquer impedimento
no processo de colher, ordenar e publicar a informação ao público, mas
jamais a insensatez de possibilitar que tal importante missão seja exercida
por pessoas inabilitadas profissionalmente. Por certo que o jornalista,
formado nas ciências das comunicações sociais, não é técnico do direito,
da medicina, da arquitetura, da engenharia, da economia. Contudo, é
técnico em buscar corretamente essas informações com as fontes corretas
e seguras, organizá-las e transmiti-las ao público. O ensino da correta
técnica de todo o processamento da notícia é que é matéria dos cursos
universitários. A vocação é nata, como em todas as demais profissões.
E para exemplificar, um advogado por mais talento que tenha para a medicina,
se também não se formou nessa ciência, não poderá receitar remédios
e tratamentos para outrem. A correta forma de informar e a sua idoneidade
é tão importante que está consagrada pela Lei de Imprensa - Lei nº 5.250/67,
que estabelece critérios para a exploração das comunicações, a fim de
preservar a sociedade de abusos da liberdade de imprensa, garantindo
reparação civil e criminal das informações distorcidas, da invasão da
privacidade, dos efeitos desses atos ilícitos, direito de resposta,
dentre outros. Por outro lado, que não se diga que a lei que regulamenta
a profissão de jornalista 'castra' a informação de assuntos técnicos
como ciências médicas, ciências jurídicas ou ciências econômicas, pois
previu a figura do COLABORADOR". Dentro
desse contexto, pois, não se pode ter por irrazoáveis os requisitos
da qualificação profissional específica (diploma em curso superior)
e registro no órgão competente estabelecidos no Decreto-Lei nº 972/69. Nesse
sentido, aliás, segue a orientação jurisprudencial dominante sobre a
questão ora posta em juízo. Veja-se, por exemplo, o seguinte julgado: "CONSTITUCIONAL.
PROCESSUAL CIVIL. LIBERDADE DE PROFISSÃO E LIBERDADE DE COMUNICAÇÃO.
JORNALISTA. EXIGÊNCIA DE DIPLOMA EM CURSO DE NÍVEL SUPERIOR. DECRETO-LEI
972/69. RECEPÇÃO. 1.
Liberdade de comunicação não se confunde com a liberdade de profissão.
Aquela é garantida a todos, protegida contra qualquer censura; esta
é livre, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer. 2.
O Decreto-lei n. 972/69, foi recepcionado pela ordem constitucional
vigente, sendo lícita a exigência de diploma em curso de nível superior
em Jornalismo para o exercício da profissão de jornalista. 3.
Apelação e remessa oficial providas. Segurança denegada. (TRF-5ªReg.,
AMS n. 85423-SE (2002.85.00.004370-), Des. Federal Luiz Alberto Gurgel
de Faria, v.u., j. em 29.6.04). O
voto do em. relator está assim fundamentado: "No
mérito, entendo que há de se distinguir a liberdade de expressão da
atividade intelectual, artística, científica e de comunicação (art.
5º, IX da CF 88), protegida contra qualquer tipo de censura, com a liberdade
de exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão (art. 5º, XIII).
Com efeito, o constituinte os diferenciou expressamente, prescrevendo
que: `XIII
- é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas
as qualificações profissionais que a lei estabelecer.´ Ora, in casu,
constata-se que o Decreto-Lei n. 972/69, em seu art. 4º, inciso V, estabeleceu
qualificação profissional para o exercício da profissão de jornalista,
a saber: diploma de curso de nível superior em Jornalismo. Vale dizer
que tal exigência não restringe o direito à comunicação, assegurado
a todos, apenas exige determinada qualificação para o exercício da profissão
de jornalista. Do contrário, a pretexto de usar da liberdade de comunicação,
ou expressão, qualquer pessoa poderia requerer qualificação de jornalista,
o que seria um absurdo maior". Nesta
C. Corte Regional há julgado de relatoria da Eminente Des. Federal Consuelo
Yoshida, assim ementado: "ADMINISTRATIVO.
EXERCÍCIO PROFISSIONAL. JORNALISTA. TRANSFORMAÇÃO DE REGISTRO PROVISIONADO
PARA CATEGORIA DE PROFISSIONAL. DECRETO-LEI Nº 972/69. LEI Nº 7.360/85.
DECRETOS NºS 83.284/79 E 91.902/85. AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS. 1.
O Texto Constitucional de 1988 ao assegurar o livre exercício de qualquer
trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais
que a lei estabelecer (art. 5º. XIII), recepcionou o Decreto-Lei 972/69,
que dispõe sobre o exercício da profissão de jornalista. 2.
Para o exercício da profissão de jornalista o art. 4º do referido Decerto-Lei
exigiu o prévio registro no órgão regional competente do Ministério
do Trabalho e Previdência Social. 3.
O art. 12 do Decreto-Lei admitiu a contratação de jornalistas para exercer
as funções relacionadas nas alíneas "a" a "g" do
artigo 6º, com a dispensa do diploma de curso superior. 4.
A Lei nº 7.360, de 10 de setembro de 1985 possibilitou a transformação
do registro de provisionado na forma do artigo 12 do Decreto-Lei 972/69
para a categoria de profissional. 5.
O Decreto nº 91.902, de 11 de novembro de 1985, regulamentou a Lei 7.360/85,
assegurou ao jornalista provisionado (na forma do artigo 12 do Decreto-Lei
nº 972/69) o direito de transformar seu registro para jornalista profissional,
desde que comprovasse dois requisitos cumulativamente: o registro como
provisionado na forma prevista pelo art. 12, do Decreto-Lei nº 972/69
e o exercício da atividade de jornalista nos 02 (dois) anos imediatamente
anteriores ao Decreto nº 83.284/79. 6. ..." (AC n. 647673, DJU 16.5.03,
p. 343). Cito,
ainda, v. acórdão do E. Tribunal Regional Federal da 4ª Região: "CONSTITUCIONAL
E ADMINISTRATIVO. REGULAMENTAÇÃO DO EXERCÍCIO PROFISSIONAL. JORNALISTA.
EXIGÊNCIA DE DIPLOMA COMO CONDIÇÃO PARA O EXERCÍCIO DA PROFISSÃO. PRECEDENTES.
ART. 5º, XIII, DA CF/88. EFEITOS. 1.
O Decreto-Lei nº 972/69 foi recepcionado pela constituição de 1988.
A regra inserta no artigo 4º do Decreto-Lei n.º 972/69, que regulamenta
a profissão de jornalista, estabelecendo requisitos para o seu exercício,
foi recepcionada pela Constituição de 1988, cujo texto reserva à lei
disciplinar o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão. 2.
Provimento da apelação e da remessa oficial" (MS 81482, Rel. Juiz
Carlos Eduardo Thompson Flores Lens, 3ª Turma, DJU 09.04.03, p.550). O
E. Superior Tribunal de Justiça já se manifestou sobre a questão, consoante
ementa a seguir transcrita: "ADMINISTRATIVO.
JORNALISTA PROFISSIONAL, REQUISITOS PARA O REGISTRO. RESTRIÇÕES A CONDIÇÕES
LEGAIS AO EXERCÍCIO DA PROFISSÃO. DECRETOS 91.902/85 E 83.284/79. LEI
7.360, DE 1985, PRECEDENTES. 1.
O Decreto nº 83.284/79, de 1979, passou a exigir o curso superior em
jornalismo para o exercício dessa profissão. A única exceção estabelecida
é a prevista na Lei nº 7.360, de 1985, ao estar assegurado o direito
dos antigos provisionados, desde que comprovem o exercício da atividade
jornalística nos dois anos anteriores à data do decreto regulamentador
n.º 91.902/85, com a finalidade de resguardar o direito adquirido. 2.
Nos termos do Decreto nº 91.902/85, há de ser preenchido o requisito
legal para a concessão do registro, o que, no caso em tela, para os
profissionais que não possuem curso superior, é a comprovação do registro
anterior como provisionado. 3.
Constitui óbice à aquisição do registro em jornalista profissional a
situação irregular consubstanciada na ausência de registro como provisionado.
Não se pode fazer tabula rasa à regulamentação que explicita as condições
para a transformação do registro provisionado, bem como aos princípios
norteadores da Administração Pública, em especial o da legalidade. 4.
Precedentes desta Corte Superior (MS nº 7140/DF e nº 180/DF)" (STJ
- REsp n. 200200192834/PR, 1ª Turma, Rel. Min. José Delgado, DJU 16.02.2004,
p. 210). Em
julgado mais antigo do C. Superior Tribunal de Justiça, datado de 29.05.2001
e publicado no DJU de 15.10.2001, p. 227 (MS 7.149/DF), o em. Ministro
Milton Luiz Pereira, relator, assim se pronunciou: "Por
essas espias, ganha significativo espaço registrar que a fonte originária
da pretensão está no diploma do Curso Superior de Direito, com a explicação
de que, apesar de faltar-lhe o diploma do Curso de Jornalismo, a Impetrante
'... atua como especialista no ramo da moda e estilo na condição consultiva
de inúmeras revistas e jornais, veículos estes que publicam seus também
inúmeros artigos, comentários e reportagens especializadas. 10.
Trata-se de uma profissional competente que vem sendo restringida de
laborar seus ofícios especializados, vez que não pode ser contratada
por uma empresa jornalística para, de forma habitual e com vínculo empregatício,
exercer seu ofício jornalístico, apesar de seu reconhecido trabalho. 11.
A limitação e a restrição são simplórias: a Impetrante não possui o
registro de jornalista, logo, não pode ser contratada por empresa jornalística
para exercer seu ofício de forma habitual. 12.
No que tange ao registro de jornalista, tem-se que o ato ilegal da douta
Autoridade Coatora consagrou a legislação arcaica, e que não foi recepcionada
pela Constituição de 1988, conforme demonstraremos oportunamente. 13.
Tal legislação - e, conseqüentemente, o ato ilegal - limitam o exercício
do trabalho da ora Impetrante, afrontando de forma cristalina e inconteste
uma de nossas maiores garantias, conforme dispõe o art. 5º, XIII, da
nossa Carta Magna...' (...) 'Adentrando
no mérito do referido dispositivo constitucional, no bojo do supra mencionado
inciso XIII, consta que, embora seja livre o exercício de qualquer profissão,
devem ser ´... atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer.' 16.
Esta qualificação profissional referida pela Constituição Federal é
que alegadamente daria sustentação, na forma do artigo 4º, do Decreto
nº 972/69, ao ato ilegal da douta Autoridade coatora. 17.
Ocorre que, vis a vis a constituição Federal, tal dispositivo do Decreto
tornou-se completamente incompatível e, por conseguinte, não recepcionado
pela atual Carta Magna.' Conquanto
as razões aduzidas mereçam reflexões, a exposição delineada pela ilustre
autoridade indigitada como coatora é suficientemente forte para convencer
da insubsistência do alegado direito líquido e certo ao pretendido registro.
Deveras, "Desde a vigência do Decreto-Lei nº 972, de 17 de outubro
de 1969, que dispõe sobre o exercício da profissão de jornalista, o
exercício desta profissão requer prévio registro no Ministério do Trabalho,
que se efetua mediante a apresentação dos documentos alinhados no art.
4º, entre os quais figura a exigência de diploma de curso superior de
Jornalismo. A fim de resguardar o direito adquirido daqueles que estavam
em atividade antes da regulamentação da profissão, o referido diploma
legal contemplou regra de direito intertemporal - art. 10 - conforme
a qual, até noventa dias após a publicação do Regulamento daquele Decreto-lei,
poderia obter registro de Jornalista Profissional quem comprovasse o
exercício anterior de profissão, por doze meses consecutivos ou 24 intercalados.
Registre-se que o primeiro regulamento do Decreto-lei 972/69 foi expedido
mediante o Decreto nº 65.912, de 19 de dezembro de 1969. Em 10.04.70,
foi editado o Decreto nº 66.431, que prorrogou o prazo por 30 (trinta)
dias. Posteriormente,
a Lei nº 5.696, de 24 de agosto de 1971, fixou novo prazo para o requerimento
do registro: um ano contado da sua publicação. 7.
Há muito se esgotaram, portanto, os prazo para requerimento e concessão
de registro de jornalista profissional aos que, embora não tivessem
o exigido curso superior, comprovassem exercício da profissão anterior
ao Decreto-lei nº 972/69. 8.
Por outro lado, cumpre esclarecer que, na redação original, o art. 4º
do Decreto-lei nº 972/69 definia o colaborador como aquele que exercesse
habitual e remuneradamente, atividade jornalística, sem relação de emprego.
Todavia, com a superveniência da lei nº 6.612, de 07 de dezembro de
1978, foi altera a definição do colaborador, verbis: ‘Art.
4º (...) §
1º (...) §
3º (...) a)
colaborador, assim entendido aquele que, mediante remuneração e sem
relação de emprego, produz trabalho de natureza técnica, científica
ou cultural, relacionado com a sua especialização, para ser divulgado
com nome e qualificação do autor’ 9.
Como se verifica, a atividade do colaborador está relacionada com a
sua especialização, não sendo considerada atividade jornalística. A
título de ilustração, o médico que escreve um artigo sobre matéria médica,
não exerce a atividade jornalística, assim como o advogado que emite
parecer acerca de questão jurídica também não, ainda que tais trabalhos
sejam publicados em jornais ou revistas. 10.
No entanto, a impetrante não se conforma em atuar como colaboradora
e, embora não preencha as condições previstas em lei, insiste em pleitear
o registro profissional de Jornalista sob o argumento de que a exigência
do diploma de curso superior de jornalismo não foi recepcionada pela
Constituição de 1988, por manifesta incompatibilidade com o art. 5º,
inc. XIII, cujo teor é o seguinte: `Art.
5º (...) XIII
- é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas
as qualificações que a lei estabelecer;´ 11.
Ora, a simples leitura do dispositivo transcrito revela que a liberdade
de exercício de profissões não é absoluta, sofre restrições na medida
em que a própria constituição comete ao legislador a atribuição de estabelecer
as qualificações indispensáveis ao exercício das profissões. 12.
Como é sabido, a profissão de jornalista é uma profissão liberal, assim
entendida a que exige, por excelência, a intervenção do intelecto e
para cujo exercício é indispensável o diploma do curso superior específico
conferido por estabelecimento de ensino autorizado ou reconhecido." Por
outro pórtico, embora versando situação profissional diferente, mas
sob a mesma aura de proteção constitucional (liberdade no exercício
de profissão) e das hipóteses cuidadas no Decreto-Lei nº 972/69, afastando
a abrangência interpretativa, esta Corte Superior tem significativo
precedente, assim resumido: "Mandado
de Segurança. Registro. Jornalista Profissional. Não atendidas as condições
previstas pelo Decreto-lei nº 91.902/85, bem como não se enquadrando
a impetrante na situação prevista no art. 10, do Decreto-Lei nº 972/69,
que, à época, ainda não exercia atividade jornalística, cujo marco inicial
ela própria fixa em 21.01.75, denega-se o mandamus." (MS nº 180/DF,
Rel, Min. Geraldo Sobral, in DJU de 6.11.89). “O
parecer do Ministério Público Federal, à sua vez, pelo itinerário das
considerações comemoradas, é objetivo na conclusão de que o ato sob
ferrete não é arbitrário ou abusivo, portanto, sem a eiva de ilegalidade
ensejadora do remédio heróico. Encerrada a exposição, desfigurado o
acenado direito líquido e certo, viga fundamental na via eleita, voto
denegando a segurança”. Deve
ser ressaltada, ainda, a louvável preocupação do autor com as populações
de localidades afastadas, onde não há jornalista, nem possibilidade
de acesso à universidade. Contudo, as normas regulamentares citadas
não se olvidaram dessas situações extremas. Note-se que nos municípios
desprovidos de curso superior em jornalismo e de profissional habilitado,
é permitida a contratação de provisionados para o desempenho da função
de jornalista sem a exigência de diploma de jornalismo (art.16 do Decreto
n.º 83.284/79). Também
restou garantido o direito de registro definitivo aos provisionados
quando da nova exigência para o exercício da profissão (art. 16 e 17
do Decreto n. 83.284/79 e art. 1º da Lei n. 7360/85), bem como garantido
o exercício da profissão sem a formação técnica para as atividades que
dela não se necessite (incisos VIII a XI do Decreto n. 83.284/79). Igualmente
ressalvado está o permissivo de contratação e remuneração de profissionais
de áreas específicas para a produção de matéria afeta à sua especialidade
(registro especial ao colaborador - Art. 5º, I, do Decreto n.º 83.284/79). Por
fim, fazem-se necessárias algumas considerações a respeito da possível
afronta à norma veiculada pela Convenção Americana de Direitos Humanos,
mais precisamente em seu art. 13, assim redigido: "Liberdade
de pensamento e expressão 1.
toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento e expressão. Esse
direito inclui a liberdade de procurar, receber, e difundir informações
e idéias de qualquer natureza, sem considerações de fronteiras, verbalmente
ou por escrito, ou em forma impressa ou artística, ou por qualquer meio
de sua escolha. 2.
o exercício do direito previsto no inciso precedente não pode estar
sujeito a prévia censura além das responsabilidades posteriores que
devem estar expressamente estabelecidas pela lei e que sejam necessárias
para assegurar o respeito aos direitos ou à reputação dos demais, ou
a proteção da segurança nacional, ou a ordem pública ou a saúde ou a
moral públicas. 3.
não se pode restringir o direito de informação por vias e meios indiretos,
tais como o abuso de controles oficiais ou particulares de papel de
imprensa, de freqüências radioelétricas ou de equipamentos e aparelhos
usados na difusão da informação, nem por quaisquer outros meios destinados
a obstar a comunicação e a circulação de idéias e opiniões". É
certo que, com a edição do Decreto nº 678/92 (DJU de 09.11.92), a Convenção
Americana Sobre Direitos Humanos, também conhecida como Pacto de São
José da Costa Rica, passou a integrar o sistema jurídico nacional. Contudo,
com a devida vênia, não vislumbro incompatibilidades entre essa norma
internacional e os direitos e garantias já assegurados em nossa Constituição
Federal relacionados com a liberdade de manifestação do pensamento (art.
5º, IV), com a liberdade de expressão (art. 5º, IX), bem assim com a
liberdade de informação (art. 220, § 1º), as quais, repito, não se confundem
com liberdade de profissão. De
qualquer forma, não se pode olvidar que, consoante referido pelo próprio
autor em sua inicial (fls. 31), o C. Supremo Tribunal Federal tem reiteradamente
decidido no sentido de que essas normas são recebidas com o status de
lei ordinária e como tal submetem-se à supremacia da Constituição Federal. Especificamente
no tocante à liberdade de informação, a Constituição Federal, no § 1º
do art. 220, não deixa qualquer dúvida de que "Nenhuma lei conterá
dispositivo que possa constituir embaraço à plena liberdade de informação
jornalística em qualquer veículo de comunicação social, observado o
disposto no art. 5º, IV, V, X, XIII e XIV" (grifei). Se
o legislador constituinte invocou expressamente a necessidade de observância
ao preceito constante do inciso XIII do art. 5º, constando deste a possibilidade
de regulamentação de determinadas profissões, evidencia-se, sob pena
de contradição ou mesmo de menção inócua e repetitiva, a intenção de
ver regulamentada a profissão voltada para a comunicação social, de
tamanha relevância na ordem social. É
certo, de igual forma, que a imprensa configura-se como um importante
instrumento da sociedade para a defesa e a manutenção do Estado Democrático
de Direito. Por
corolário, imprensa e liberdade são termos inseparáveis, sendo inconcebível
a existência da imprensa sem a garantia da liberdade de expressão e
manifestação de pensamento, quando somente por meio dela a sociedade
pode concretizar o direito à informação, tutelado no texto constitucional
vigente. É
justamente considerando a relevância da questão da imprensa na formação
de uma nação e na manutenção de um Estado Democrático é que, a profissão
de jornalista comporta regulamentação e exigência de qualificação para
seu exercício, sem qualquer ofensa ao princípio da proporcionalidade
e razoabilidade. Ao contrário, a limitação é permitida no próprio texto
constitucional, elevando, inclusive, o princípio da dignidade humana
como um de seus principais fundamentos. Por
todo o exposto, impõe-se a conclusão que todas as normas veiculadas
pelo Decreto-Lei nº 972/69 foram integralmente recepcionadas pelo sistema
constitucional vigente, sendo legítima a exigência do preenchimento
dos requisitos da existência do prévio registro no órgão regional competente
e do diploma de curso superior de jornalismo para o livre exercício
da profissão de jornalista. Em conseqüência, é de rigor o decreto de
total improcedência da presente ação, com a cessação da eficácia da
tutela antecipada concedida parcialmente. Sem
condenação de custas processuais e honorários advocatícios, nos termos
do artigo 18 da Lei n. 7.347/85. Por
esses fundamentos e para tais fins, rejeito as preliminares e, no mérito,dou
provimento aos recursos de apelação da União, da FENAJ - Federação Nacional
dos Jornalistas e do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado
de São Paulo e à remessa oficial e julgo prejudicada a apelação do Ministério
Público Federal. É
o voto. MANOEL
ÁLVARES Juiz
Federal Convocado Relator EMENTA
CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REQUISITOS PARA
O EXERCÍCIO DA PROFISSÃO DE JORNALISTA. LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO
PÚBLICO FEDERAL. FENÔMENO DA RECEPÇÃO. VIA ADEQUADA. MATÉRIA EMINENTEMENTE
DE DIREITO. JULGAMENTO ANTECIPADO. POSSIBILIDADE. INEXISTÊNCIA DE LITISCONSÓRCIO
NECESSÁRIO COM OUTROS SINDICATOS. DECRETO- LEI N. 972/69. RECEPÇÃO FORMAL
E MATERIAL PELA CARTA POLÍTICA DE 1988. EXIGÊNCIA DE CURSO SUPERIOR
DE JORNALISMO. AUSÊNCIA DE OFENSA À LIBERDADE DE TRABALHO E DE IMPRENSA
E ACESSO À INFORMAÇÃO. PROFISSÃO DE GRANDE RELEVÂNCIA SOCIAL QUE EXIGE
QUALIFICAÇÃO TÉCNICA E FORMAÇÃO ESPECIALIZADA. INEXISTÊNCIA DE OFENSA
À CONVENÇÃO AMERICANA SOBRE DIREITOS HUMANOS. 1.
Legitimidade do Ministério Público Federal para propor ação civil pública,
ante o interesse eminentemente de ordem social e pública, indo além
dos interesses individuais homogêneos do exercício da profissão de jornalista,
alcançando direitos difusos protegidos constitucionalmente, como a liberdade
de expressão e acesso à informação. 2.
Legítima e adequada a via da ação civil pública, em que se discute a
ocorrência ou não do fenômeno da recepção, não se podendo falar em controle
de constitucionalidade. 3.
Havendo prova documental suficiente para formar o convencimento do julgador
e sendo a matéria predominantemente de direito, possível o julgamento
antecipado da lide. 4.
Todos os Sindicatos da categoria dos jornalistas são legitimados a habilitar-se
como litisconsortes facultativos, nos termos do § 2º do art. 5º da Lei
nº 7.347/85. Não configuração de litisconsórcio necessário. 5.
A vigente Constituição Federal garante a todos, indistintamente e sem
quaisquer restrições, o direito à livre manifestação do pensamento (art.
5º, IV) e à liberdade de expressão, independentemente de censura ou
licença (art. 5º, IX). São direitos difusos, assegurados a cada um e
a todos, ao mesmo tempo, sem qualquer barreira de ordem social, econômica,
religiosa, política, profissional ou cultural. Contudo, a questão que
se coloca de forma específica diz respeito à liberdade do exercício
de qualquer trabalho, ofício ou profissão, ou, simplesmente, liberdade
de profissão. Não se pode confundir liberdade de manifestação do pensamento
ou de expressão com liberdade de profissão. Quanto a esta, a Constituição
assegurou o seu livre exercício, desde que atendidas as qualificações
profissionais estabelecidas em lei (art. 5º, XIII). O texto constitucional
não deixa dúvidas, portanto, de que a lei ordinária pode estabelecer
as qualificações profissionais necessárias para o livre exercício de
determinada profissão. 6.
O Decreto-Lei n. 972/69, com suas sucessivas alterações e regulamentos,
foi recepcionado pela nova ordem constitucional. Inexistência de ofensa
às garantias constitucionais de liberdade de trabalho, liberdade de
expressão e manifestação de pensamento. Liberdade de informação garantida,
bem como garantido o acesso à informação. Inexistência de ofensa ou
incompatibilidade com a Convenção Americana Sobre Direitos Humanos. 7.
O inciso XIII do art. 5º da Constituição Federal de 1988 atribui ao
legislador ordinário a regulamentação de exigência de qualificação para
o exercício de determinadas profissões de interesse e relevância pública
e social, dentre as quais, notoriamente, se enquadra a de jornalista,
ante os reflexos que seu exercício traz à Nação, ao indivíduo e à coletividade. 8.
A legislação recepcionada prevê as figuras do provisionado e do colaborador,
afastando as alegadas ofensas ao acesso à informação e manifestação
de profissionais especializados em áreas diversas. 9.
Precedentes jurisprudenciais. 10.
Preliminares rejeitadas. 11.
Apelações da União, da FENAJ e do Sindicato dos Jornalistas providas. 12.
Remessa oficial provida. 13.
Apelação do Ministério Público Federal prejudicada. ACÓRDÃO Vistos,
relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima indicadas,
decide a E. 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, à unanimidade,
rejeitar as preliminares, e, no mérito, dar provimento aos recursos
de apelação da União, da FENAJ, do Sindicato dos Jornalistas e à remessa
oficial, julgando prejudicado o recurso de apelação do Ministério Público
Federal, nos termos do relatório e voto do Senhor Juiz Federal Convocado
Relator e na conformidade da ata de julgamento, que ficam fazendo parte
integrante do presente julgado. São
Paulo, 26 de outubro de 2005. MANOEL
ÁLVARES Juiz
Federal Convocado Relator |