Os jornalistas precisam de um
Conselho
A
discussão da necessidade de criação de um órgão
de fiscalização profissional que substituísse as
DRTs é bastante antiga. Vários projetos já foram
encaminhados ao Congresso Nacional, o primeiro em 1965. Na década
de 80 esse debate foi retomado com vigor entre os jornalistas. A criação
do Conselho Federal de Jornalismo entrou na pauta de discussões
dos Congressos Nacionais de Jornalistas em 1990
(Florianópolis), 1991 (Brasília), 1996 (Porto Alegre) e
1997 (Extraordinário -Vila Velha)
A proposta, no entanto, ficou em segundo plano, enquanto a Fenaj se empenhava
para ver aprovado projeto de lei que passava para ela a atribuição
de conceder o pré-registro dos jornalistas, para posterior homologação
do Ministério do Trabalho. Esse texto, que ficou conhecido como
projeto Carlos Bezerra, acabou vetado pelo presidente Fernando Henrique
Cardoso, em 1999, quando o ministro do Trabalho era Francisco Dornelles.
Em sua argumentação pelo veto, o ministro defendeu a tese
de que a concessão de registro profissional é atribuição
do Estado e que só poderia ser transferida para um Conselho Profissional.
Após esse veto, voltou a primeiro plano a proposta do CFJ, aprovada
no 29º Congresso Nacional de Jornalistas de Salvador, em setembro
de 2000. Aprovada definitivamente a idéia da criação
da CFJ, optou-se por um projeto de lei amplo, englobando toda a legislação
que regulamenta o exercício da profissão de jornalistas,
contemplando as emendas a essa legislação aprovadas no próprio
Congresso de Salvador.
Em março de 2001, em reunião do Conselho de Representantes
da Fenaj, Brasília, foi criada uma comissão de jornalistas
responsáveis pela elaboração do anteprojeto, cujo
texto foi enviado a todos os Sindicatos de Jornalistas do país
para que fosse debatido e emendado. Cumprida essa etapa, o texto foi novamente
apresentado aos delegados presentes ao 30º Congresso Nacional dos
Jornalistas, em junho de 2002, em Manaus. O debate realizado no plenário
do 30º Congresso gerou novas sugestões que foram acrescidas
ao anteprojeto.
No segundo semestre de 2002, a direção da Fenaj entregou
o anteprojeto ao governo federal, que não deu andamento ao mesmo.
Em fevereiro de 2003, com o novo governo, a direção da Fenaj
faz nova entrega do anteprojeto, agora ao ministro do Trabalho, Jacques
Wagner, que determina a formação de uma comissão
para estudar o assunto.
Ainda em 2003, em reunião do Conselho de Representantes dos Sindicatos,
decidiu-se propor ao Ministério do Trabalho, a redução
do texto do anteprojeto, com a intenção de facilitar sua
tramitação no Legislativo. O enxugamento significou a retirada
de artigos sobre nossa regulamentação profissional, a maioria
já contemplados na legislação existente, e a adequação
técnica do texto.
Em 7 de abril de 2004, Dia do Jornalista, a direção da Fenaj,
acompanhada de dirigentes de 17 sindicatos de jornalistas, tiveram audiência
com o Presidente Lula, quando solicitaram, conforme divulgado por toda
mídia brasileira, agilidade no envio ao Legislativo, da proposta
de criação do CFJ, que ainda estava em fase final de análise
no Ministério do Trabalho.
Em 4 de agosto de 2004, dia da abertura do 31º Congresso Nacional
de Jornalistas, realizado em João Pessoa-PB, o governo enviou nosso
Projeto de Lei à Câmara dos Deputados.
O ataque das empresas
Desde o encaminhamento do projeto ao Congresso, a FENAJ e os Sindicatos
dos Jornalistas de todo o País promoveram, como estava programado,
centenas de debates sobre o CFJ, com a participação de milhares
de pessoas. Também foram realizadas audiências públicas
e sessões especiais em Assembléias Legislativas, Câmaras
Municipais, faculdades e, em todas elas, a criação do CFJ
teve ampla aprovação. A FENAJ conquistou, igualmente, apoios
de instituições paradigmáticas como a OAB nacional
e como o "Conselhão", que reúne todos os Conselhos
profissionais do País. Conquistou, também, o apoio de todos
os parlamentares com que fez contato direto.
O esforço de ampliar o debate para toda a sociedade resultou em
importantes contribuições ao projeto de lei. Com base nestas
contribuições, o Conselho de Representantes dos Sindicatos
junto à FENAJ, reunido no dia 13 de novembro em Brasília,
aprovou uma proposta de alteração no projeto de lei, para
que não haja dúvidas sobre o caráter democrático
e plural do CFJ. A proposta, sob formato de substitutivo, foi distribuída
no Congresso Nacional.
No dia 15 de dezembro, através de votação simbólica,
atendendo acordo de lideranças, sem nenhum debate público,
a Câmara dos Deputados cede ao forte lobby patronal e decide rejeitar
o projeto de Criação do CFJ.
Esta é a íntegra da Nota Oficial divulgada pela Fenaj momentos
depois da decisão dos deputados:
Patrões,
parlamento e governo se unem para enterrar projeto do CFJ
Fenaj segue na luta pela regulamentação, qualidade e ética
no Jornalismo.
O
projeto que propõe o Conselho Federal dos Jornalistas está
morto. A esperança de milhares de jornalistas e a expectativa de
segmentos sociais importantes foram enterradas pelos coveiros tradicionais
da democracia e da organização da sociedade, aliados a inusitados
novos cúmplices.
Criticado à histeria desde o anúncio do seu encaminhamento
à Câmara dos Deputados pelo Executivo, o projeto do CFJ foi
acusado, entre coisas, de ser autoritário, de atender a uma suposta
tentativa de cerceamento da imprensa pelo Governo Federal e de manietar
os jornalistas num código de ética corporativo e principalmente,
de ser ilegítimo por ser proposto por uma entidade sindical, a
Federação Nacional dos Jornalistas. As verdadeiras intenções
desses críticos ficaram até agora encobertas pelo manto
obscurantista de uma mídia historicamente articulada com os segmentos
mais atrasados do país.
O projeto do CFJ está morto e dançam sobre sua tumba os
interesses aparentemente mais contraditórios. Os empresários
da mídia brasileira devem se regozijar. Mais uma vez seus desejos
são atendidos. Escondidos atrás de um inverossímil
discurso de liberdade de imprensa, na verdade sempre tiveram a mais medíocre
das intenções: manter as condições salariais
e de trabalho dos jornalistas nos níveis mais baixos possíveis
para compensar suas cambaleantes taxas de lucros. Os empresários
não admitem a normatização ética da profissão,
porque querem manter o poder de decisão sobre o que pode e o que
não pode ser informado à população. Os donos
da mídia e do poder real, mais uma vez, impuseram sua vontade.
Indisfarçável satisfação devem estar sentido
alguns jornalistas desinformados e/ou mal intencionados, notoriamente
aqueles com espaço concedido e privilegiado, que serviram como
verdadeiros cães de guarda da monopolizada mídia nacional.
Durante o debate público, suscitado pelo envio do projeto, era
visível o alinhamento submisso à retórica patronal
de preconceito e infâmia.
Alívio deve estar sentindo o parlamento brasileiro. Um parlamento
que, composto em grande parte de proprietários de veículos
de comunicação, reproduziu mais uma vez o lamentável
espetáculo da barganha, chantagem, coerção e principalmente,
covardia. O processo, conduzido pelo presidente da Câmara, Deputado
João Paulo Cunha, pelo líder do Governo Deputado Luizinho
e pelo líder do PFL, José Carlos Aleluia, sonegou à
sociedade brasileira a possibilidade de continuar o debate sobre o mais
secreto e antidemocrático poder instituído no país
que é o poder das empresas de comunicação. Uma constrangedora
unanimidade se construiu em torno de um pragmatismo lamentável
e, como cúmplice silencioso, permitiu o assassinato do projeto.
A maior demonstração de subserviência, foi a indicação
do deputado Nelson Proença para a relatoria – um histórico
defensor dos interesses dos donos da mídia, proprietário
de uma rede de rádios no interior do RS. A FENAJ ressalva e louva
a posição da bancada do PCdoB que rejeitou o acordo de lideranças
para sepultar o projeto e estranha o comportamento de partidos do campo
democrático e popular que avalizaram tal impostura.
Melancólico foi o comportamento do governo que, se num primeiro
momento compreendeu a justeza da reivindicação dos jornalistas
e encaminhou o projeto, em seguida sucumbiu à prática de
balcão de negócios estabelecida com o Congresso e, parecendo
admitir as acusações de tentativa de cerceamento da imprensa,
abandona o projeto de organização da profissão de
jornalista à própria sorte.
Mas se o projeto do CFJ está morto, viva o Conselho Federal dos
Jornalistas que advirá desse embate. Não é possível
que o enorme esforço dos jornalistas brasileiros seja jogado no
lixo, como aliás está nesse momento a lei que regulamenta
a profissão. Não podemos permitir que manifestações
generosas e fraternas de alguns parlamentares, entidades e organizações,
como a OAB entre muitas, sejam em vão.
Os jornalistas brasileiros não desistirão de terem o controle
do seu destino, que é a auto-regulamentação de sua
profissão. Há 39 anos, o Congresso arquivou o primeiro projeto
de criação de um Conselho Federal dos Jornalistas. Essa
não é a primeira, e não será a última
vez que nos mobilizamos. A FENAJ - que nos últimos quatro meses
liderou um rico e histórico processo de debate sobre o jornalismo
e os interesses privados que controlam a mídia no país -
seguirá firme na luta. Mais do que uma legítima reivindicação
de organização profissional, o CFJ é um importante
instrumento de valorização da profissão e de garantia
de uma informação de qualidade, pautada em princípios
democráticos e éticos.
Brasília,
15 de dezembro de 2004.
Diretoria da Federação Nacional dos Jornalistas
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